Fl❀rdecera
quinta-feira, 17 de março de 2011
terça-feira, 15 de março de 2011
Amor de pai...
De pai pra filho
Autor: Argemiro Garcia*Achei que te perdi,
mas me achei perdido!
mas me achei perdido!
Indeciso, procurei
o que ainda não achara.
o que ainda não achara.
quisera saber mais
e mais te oferecer
pra te ver a cara
a sorrir e, sorrindo,
contar-me os teus dias
de silêncio,
as tardes quentes
e as noites frias,
os medos que sentias,
os desejos.
e mais te oferecer
pra te ver a cara
a sorrir e, sorrindo,
contar-me os teus dias
de silêncio,
as tardes quentes
e as noites frias,
os medos que sentias,
os desejos.
De ti não tenho histórias,
tenho beijos.
Salvador, 14/1/2010.
tenho beijos.
Salvador, 14/1/2010.
*Argemiro Garcia é geólogo, reside em Salvador, é pai de três filhos, sendo um deles com autismo.
segunda-feira, 14 de março de 2011
Combatendo o Autismo: consertando um neurônio de cada vez
Há poucas semanas surpreendemos o mundo acadêmico ao anunciar a quebra de um dogma da neurociência. Conseguimos, pela primeira vez na história, acompanhar o desenvolvimento de neurônios derivados de pacientes com o espectro autista e revertê-los ao estado normal. A descoberta, capa da prestigiosa revista científica Cell, traz a esperança de que um dia possamos reverter os sintomas do autismo, aliviando o sofrimento de milhares de crianças no mundo todo. Como chegamos aqui e as consequências dessa descoberta estão descritas nos parágrafos abaixo. Boa leitura!
A ideia
Em 2006, estava numa palestra num congresso de células-tronco internacional quando ouvi o pesquisador japonês Shynia Yamanaka relatar seus dados preliminares sobre a tecnologia de reprogramação celular. Ele não havia ainda conseguido transformar uma célula somática (da pele) em uma célula-tronco pluripotente, mas apresentou os experimentos em andamento. Nos corredores do congresso, o trabalho foi duramente criticado por colegas da área. Afinal, parecia impossível fazer isso, esses experimentos levariam anos. Shynia estaria louco.
Louco ou não, naquela hora eu achei que se aquilo realmente funcionasse, eu seria um dos primeiros a aplicar a nova tecnologia para o entendimento de uma doença do desenvolvimento. Não via a tecnologia apenas como alternativa para o uso de células-tronco embrionárias humanas, enxerguei a oportunidade de usar a tecnologia para a modelagem de doenças humanas. Escrevi nesse blog que essa seria uma descoberta revolucionária. Bola na caçapa. O japonês virou o campo das células-tronco de cabeça-pra-baixo ao apresentar as células iPS (do inglês, induced pluripotent stem cells), em dois trabalhos publicados na revista Cell. A tecnologia é tão simples que se espalhou pelo mundo todo, uma verdadeira Yamanakamania.
Em 2008 comecei a liderar meu próprio laboratório na Universidade da Califórnia em San Diego. Meu primeiro gol seria o de reproduzir neurônios do espectro autista usando a tecnologia de Yamanaka. A escolha da síndrome foi feita a dedo: começaria com a síndrome de Rett. Por ser rara, nem mesmo cientistas ou médicos são familiarizados com essa síndrome e ignoram que pacientes com autismo clássico possam ter mutações no mesmo gene que causa Rett. Mais importante ainda, dados recentes revelam que vias neurais afetadas podem ser comuns entre diversas doenças neurológicas. O espectro autista é composto por um leque de síndromes que possuem duas características em comum: a dificuldade de socialização e movimentos repetitivos. Pacientes com Rett estão no extremo mais dramático do autismo, pois além desses problemas apresentam dificuldades motoras e ataques epilépticos, entre outros sintomas. Assim, se conseguisse entender o extremo mais dramático do espectro, as portas estariam abertas para as outras síndromes.
Outra razão por começar com Rett: a causa genética da doença está bem definida, ou seja, sabemos qual é o gene responsável na maioria dos casos. Isso foi crucial no trabalho, para mostrar que as características neuronais que estávamos observando em Rett não vinham do ambiente. Por último, diria que o fato de terem sido observadas melhoras num modelo murino (em um rato) de Rett, eram evidências fortes de que a síndrome poderia ser também reversível em humanos. Comentei essa descoberta aqui. Por essas razões achei que seria mais fácil modelar Rett do que outras síndromes do espectro.
Mas nem todo mundo achou que minha escolha da síndrome de Rett era boa, pois neurônios humanos são bem mais complexos que de camundongos. Além disso, a síndrome só se manifesta mais tarde, depois do primeiro ano, e o que eu teria no laboratório seriam neurônios semelhantes aos embrionários. Com uma boa experiência em células-tronco neurais e embrionárias, via uma janela de oportunidade. Apesar da concorrência feroz nesse campo, acreditava que estaria em vantagem, mas não iria conseguir fazer isso sozinho. O primeiro grande desafio foi o de recrutar cientistas que topassem embarcar num projeto altamente arriscado, sem a menor garantia de sucesso.
O time
Comecei o trabalho ao lado de Carol Marchetto, cientista brasileira do Instituto Salk, vizinho a Universidade da Califórnia. Carol e eu já assinamos diversos trabalhos científicos e temos uma sinergia enorme. Juntos, derivamos as primeiras células neuronais de pacientes e alguns meses depois já estávamos quantificando as conexões neurais. O trabalho caminhava num ritmo frenético quando um dia encontramos todas as nossas células mortas. Por alguma razão ainda misteriosa, todos os nossos neurônios haviam se descolado das placas. A frustração aumentou quando soubemos da publicação de células iPS de Rett por um grupo competidor – eles estavam bem mais na nossa frente agora. Mesmo assim, sorrimos por duas razões: o grupo não tinha experiência com neurônios e, portanto, não haviam colocado esforço nesses experimentos. Segundo, se tínhamos competidores, a ideia era quente. Voltamos ao trabalho.
O projeto era agora ainda mais arriscado e precisávamos de ajuda. Estava cada vez mais ocupado com aulas e escrevendo “grants” (financiamentos) para me sustentar. Nos EUA, o salário do pesquisador é pago por ele mesmo por meio de aplicações de grants para agências de fomento.
Por causa da crise, apenas 8% a 10% dos grants são financiados, o que tem fechado diversos laboratórios nos EUA. Inspirado pelo explorador Ernest Shackleton, resolvi recrutar pessoas com uma habilidade excepcional e capacidade de trabalhar em time. Postei o anúncio ao lado e comecei a entrevistar candidatos. Como requisito mínimo, teriam de dividir o sonho, não ter medo de trabalhar longas horas, não se importar com a concorrência e rir em momentos de estresse. Queria só a nata dos melhores pesquisadores, os mais resistentes ao meu lado.
Encontrei o Cassiano Carromeu em visita ao Brasil. Conversamos e percebi que ele tinha o perfil exato. Cassiano estava disposto a migrar para a Califórnia em busca de questões científicas desafiadoras, deixando a segurança de um laboratório famoso ou já estabelecido de lado. Comigo e Carol, passou a liderar o trabalho, derivando células iPS de outros pacientes e induzindo a diferenciação neuronal. A sincronia entre nós era grande e passamos a gerar dados loucamente. Não havia noite ou dia, final de semana ou feriado. Foram horas e horas no microscópio, sala de cultura etc. Estávamos viciados no projeto e as diferenças entre os neurônios autistas e normais começavam a aparecer.
A publicação
Os dados estavam cada vez mais convincentes. Decidimos então testar algumas drogas e arriscar na reversibilidade dos sintomas. No início, tivemos alguns problemas. As doses estavam sendo tóxicas, talvez fosse preciso gastar um tempo ajustando as concentrações para neurônios humanos. Ninguém nunca tinha testado nada em neurônios humanos antes, não havia literatura para consultar, éramos pioneiros e tínhamos pressa. Quando vi os dados da reversão com a primeira droga, pulei de alegria. Esse “estado autista” que observávamos nos neurônios não era permanente! Se conseguíssemos reverter um neurônio por vez, poderíamos reverter o cérebro inteiro. Esse pensamento não me saia da cabeça.
Nessa época, o trabalho já estava rascunhado e foi só acrescentar esse dado antes de submetê-lo para as revistas. A primeira submissão foi um balde de água gelada: o trabalho fora recusado. Os revisores não viram a relevância em usar neurônios humanos. Com medo de soar arrogante, não havia deixado claras as implicações do trabalho. Mea culpa. Reescrevi tudo e mandamos para a Cell, com receio de que essa revista fosse ainda mais rigorosa que a anterior. Dessa vez, todos os revisores foram positivos. Porém, o número de experimentos extras, controles etc. que haviam pedido era surreal. Recrutamos outros pesquisadores para ajudar em técnicas mais específicas.
Hoje em dia, a ciência é multidisciplinar. É um erro tentar fazer tudo sozinho. Foram mais alguns meses de completa insanidade. Ganhei meus primeiros cabelos brancos, Carol ganhou uma gastrite e o Cassiano aumentou o consumo de chocolate. O trabalho ainda passou por mais algumas revisões até ser formalmente aceito pela revista. A comparação entre as atividades de neurônios autistas e neurônios normais foi ilustrada em vídeo, que vale mais do que mil palavras.
O impacto
O espectro autista afeta 1 em cada 105 crianças nos EUA. O autismo, assim como outras doenças psiquiátricas, sofre com o estigma de que não tem cura. Além disso, existe um outro estigma: o de que essas doenças são causadas por falta de afeto ou por descuido dos pais. Na década de 70, mães e pais de pacientes com doenças psiquiátricas eram submetidos a tratamentos médicos, não as crianças. Em conversa com pais, muitos ainda revelam o peso desse preconceito, vindo de outros pais ou da culpa que sentem.
Em nossos experimentos, conseguimos corrigir o defeito genético nos neurônios dos pacientes, evitando o aparecimento das “características autistas”. Esse dado sugere uma forte evidência contra fatores ambientais no desenvolvimento dessa síndrome. Como não conhecemos a base genética de outros pacientes com autismo, fica difícil estender essas observações para todo o espectro. De qualquer forma, entender como o autismo surge, suas bases biológicas e neuronais, deve contribuir para a redução desse estigma e estereótipo de pacientes com doenças mentais.
O fato de conseguir modelar o espectro autista em laboratório deve abrir portas para uma série de outras doenças neurológicas. Antecipo que outros grupos vão utilizar a mesma estratégia para esquizofrenia, depressão, bipolaridade, entre tantas outras doenças do desenvolvimento ou psiquiátricas. O impacto do uso das células iPS nesse tipo de modelagem promete acelerar as descobertas cientificas no mundo todo. Além disso, sugere que a técnica possa ser implementada como uma ferramenta de diagnóstico, permitindo antecipar o aparecimento dos sintomas e começar os tratamentos mais cedo. Imagino que as firmas de seguro-saúde vão compreender o significado disso em breve. De qualquer forma, acho que esse é o primeiro passo para uma futura medicina personalizada.
Mas talvez o impacto maior seja o da possibilidade de reverter a doença. As drogas que foram usadas no trabalho para a reversão dos neurônios dos pacientes para um estado “normal” foram o IGF1 e a gentamicina. O IGF1 é um fator que estimula as células neurais, provavelmente através de uma cascata de ativação de outros genes que auxiliam no desenvolvimento neuronal. Para chegar na fase clínica, o IGF1 teria de ser modificado quimicamente para facilitar sua penetração no sistema nervoso. Nossos dados mostram que será preciso cautela, pois o IGF1 pode super-estimular os neurônios, causando efeitos colaterais como ataques epilépticos, por exemplo. A gentamicina atua de uma outra forma, apenas em mutações genéticas específicas. Além disso, é tóxica in vivo.
De qualquer forma, tenho recebido algumas mensagens da industria farmacêutica, o que indica um interesse desse setor no desenvolvimento de melhores drogas. Melhor ainda, nosso dados estão sendo úteis para o avanço dos primeiros testes clínicos de pacientes Rett, em Boston, EUA. Resultados positivos desse teste vão expandir as possibilidades de tratamento para outras partes do mundo.
Consequências da reversão
Vamos supor que realmente encontremos uma droga capaz de reverter o estado autista de neurônios em cultura e que, quando aplicados em humanos, conseguisse consertar todos os neurônios do cérebro humano. Seria essa então a cura do autismo? As observações que fizemos dizem respeito ao número de sinapses. Sinapses são as estruturas responsáveis pela transmissão da informação entre um neurônio e outro. Essas conexões nervosas formam redes que estão envolvidas em diversos processos cognitivos, como aprendizado, consciência e memória. Ao elevarmos o número de sinapses no cérebro de um paciente com autismo por meio de um futuro tratamento, a expectativa é que ele restabeleça conexões neurais, comportando-se como um cérebro normal.
Mas o que aconteceria com a memória? E as habilidades cognitivas que diferenciam das outras crianças e as tornam tão especiais? Tive essa discussão com Ana Parreira, mãe de uma criança com Asperger, outra síndrome do espectro autista. Ana me escreveu por e-mail, preocupada com o fato de que uma futura terapia poderia apagar as habilidades criativas de seu filho. Na verdade, essa é uma possibilidade real, mas não sabemos se isso vai realmente acontecer. Só vamos descobrir durante os ensaios clínicos, pois modelos animais são difíceis de interpretar, principalmente quando olhamos para criatividade, afeto e outras características tipicamente humanas.
Assim como Ana, recebi centenas de mensagens de familiares e pais de pacientes com o espectro autista. Infelizmente, não vou conseguir responder a todos, mas não deixo de apreciar todo o carinho e apoio. Isso traz muita motivação para mim e todo o grupo. Sou grato e honrado por ter tocado tantas pessoas através da ciência.
O futuro
Nosso grupo decidiu que não vai esperar pelo posicionamento da indústria farmacêutica, em geral com menos entusiasmo para projetos arriscados. Vamos seguir em frente de forma independente para o estabelecimento de uma plataforma para triagem de novos medicamentos automatizada. Esse projeto multidisciplinar envolve profissionais de diversas áreas do conhecimento, biólogos, engenheiros, matemáticos e médicos. Não vai ser fácil, pois precisamos otimizar diversas etapas do processo, mas qual seria a graça da vida se tudo fosse simples e previsível?
Tenho orgulho de ter participado com meus colegas dessa pesquisa que rompe barreiras e desafia os fundamentos da neurociência e da própria psiquiatria. Nasci ouvindo que o espectro autista não tem cura. Acho que isso é um mito. Amanhã no laboratório vamos ousar algo novo. A ciência é assim, todo dia uma nova aventura, trazendo esperanças e nos fazendo sonhar com oportunidades que antes pareciam impossíveis.
A ideia
Em 2006, estava numa palestra num congresso de células-tronco internacional quando ouvi o pesquisador japonês Shynia Yamanaka relatar seus dados preliminares sobre a tecnologia de reprogramação celular. Ele não havia ainda conseguido transformar uma célula somática (da pele) em uma célula-tronco pluripotente, mas apresentou os experimentos em andamento. Nos corredores do congresso, o trabalho foi duramente criticado por colegas da área. Afinal, parecia impossível fazer isso, esses experimentos levariam anos. Shynia estaria louco.
Louco ou não, naquela hora eu achei que se aquilo realmente funcionasse, eu seria um dos primeiros a aplicar a nova tecnologia para o entendimento de uma doença do desenvolvimento. Não via a tecnologia apenas como alternativa para o uso de células-tronco embrionárias humanas, enxerguei a oportunidade de usar a tecnologia para a modelagem de doenças humanas. Escrevi nesse blog que essa seria uma descoberta revolucionária. Bola na caçapa. O japonês virou o campo das células-tronco de cabeça-pra-baixo ao apresentar as células iPS (do inglês, induced pluripotent stem cells), em dois trabalhos publicados na revista Cell. A tecnologia é tão simples que se espalhou pelo mundo todo, uma verdadeira Yamanakamania.
Em 2008 comecei a liderar meu próprio laboratório na Universidade da Califórnia em San Diego. Meu primeiro gol seria o de reproduzir neurônios do espectro autista usando a tecnologia de Yamanaka. A escolha da síndrome foi feita a dedo: começaria com a síndrome de Rett. Por ser rara, nem mesmo cientistas ou médicos são familiarizados com essa síndrome e ignoram que pacientes com autismo clássico possam ter mutações no mesmo gene que causa Rett. Mais importante ainda, dados recentes revelam que vias neurais afetadas podem ser comuns entre diversas doenças neurológicas. O espectro autista é composto por um leque de síndromes que possuem duas características em comum: a dificuldade de socialização e movimentos repetitivos. Pacientes com Rett estão no extremo mais dramático do autismo, pois além desses problemas apresentam dificuldades motoras e ataques epilépticos, entre outros sintomas. Assim, se conseguisse entender o extremo mais dramático do espectro, as portas estariam abertas para as outras síndromes.
Outra razão por começar com Rett: a causa genética da doença está bem definida, ou seja, sabemos qual é o gene responsável na maioria dos casos. Isso foi crucial no trabalho, para mostrar que as características neuronais que estávamos observando em Rett não vinham do ambiente. Por último, diria que o fato de terem sido observadas melhoras num modelo murino (em um rato) de Rett, eram evidências fortes de que a síndrome poderia ser também reversível em humanos. Comentei essa descoberta aqui. Por essas razões achei que seria mais fácil modelar Rett do que outras síndromes do espectro.
Mas nem todo mundo achou que minha escolha da síndrome de Rett era boa, pois neurônios humanos são bem mais complexos que de camundongos. Além disso, a síndrome só se manifesta mais tarde, depois do primeiro ano, e o que eu teria no laboratório seriam neurônios semelhantes aos embrionários. Com uma boa experiência em células-tronco neurais e embrionárias, via uma janela de oportunidade. Apesar da concorrência feroz nesse campo, acreditava que estaria em vantagem, mas não iria conseguir fazer isso sozinho. O primeiro grande desafio foi o de recrutar cientistas que topassem embarcar num projeto altamente arriscado, sem a menor garantia de sucesso.
O time
Comecei o trabalho ao lado de Carol Marchetto, cientista brasileira do Instituto Salk, vizinho a Universidade da Califórnia. Carol e eu já assinamos diversos trabalhos científicos e temos uma sinergia enorme. Juntos, derivamos as primeiras células neuronais de pacientes e alguns meses depois já estávamos quantificando as conexões neurais. O trabalho caminhava num ritmo frenético quando um dia encontramos todas as nossas células mortas. Por alguma razão ainda misteriosa, todos os nossos neurônios haviam se descolado das placas. A frustração aumentou quando soubemos da publicação de células iPS de Rett por um grupo competidor – eles estavam bem mais na nossa frente agora. Mesmo assim, sorrimos por duas razões: o grupo não tinha experiência com neurônios e, portanto, não haviam colocado esforço nesses experimentos. Segundo, se tínhamos competidores, a ideia era quente. Voltamos ao trabalho.
O projeto era agora ainda mais arriscado e precisávamos de ajuda. Estava cada vez mais ocupado com aulas e escrevendo “grants” (financiamentos) para me sustentar. Nos EUA, o salário do pesquisador é pago por ele mesmo por meio de aplicações de grants para agências de fomento.
Por causa da crise, apenas 8% a 10% dos grants são financiados, o que tem fechado diversos laboratórios nos EUA. Inspirado pelo explorador Ernest Shackleton, resolvi recrutar pessoas com uma habilidade excepcional e capacidade de trabalhar em time. Postei o anúncio ao lado e comecei a entrevistar candidatos. Como requisito mínimo, teriam de dividir o sonho, não ter medo de trabalhar longas horas, não se importar com a concorrência e rir em momentos de estresse. Queria só a nata dos melhores pesquisadores, os mais resistentes ao meu lado.
Encontrei o Cassiano Carromeu em visita ao Brasil. Conversamos e percebi que ele tinha o perfil exato. Cassiano estava disposto a migrar para a Califórnia em busca de questões científicas desafiadoras, deixando a segurança de um laboratório famoso ou já estabelecido de lado. Comigo e Carol, passou a liderar o trabalho, derivando células iPS de outros pacientes e induzindo a diferenciação neuronal. A sincronia entre nós era grande e passamos a gerar dados loucamente. Não havia noite ou dia, final de semana ou feriado. Foram horas e horas no microscópio, sala de cultura etc. Estávamos viciados no projeto e as diferenças entre os neurônios autistas e normais começavam a aparecer.
A publicação
Os dados estavam cada vez mais convincentes. Decidimos então testar algumas drogas e arriscar na reversibilidade dos sintomas. No início, tivemos alguns problemas. As doses estavam sendo tóxicas, talvez fosse preciso gastar um tempo ajustando as concentrações para neurônios humanos. Ninguém nunca tinha testado nada em neurônios humanos antes, não havia literatura para consultar, éramos pioneiros e tínhamos pressa. Quando vi os dados da reversão com a primeira droga, pulei de alegria. Esse “estado autista” que observávamos nos neurônios não era permanente! Se conseguíssemos reverter um neurônio por vez, poderíamos reverter o cérebro inteiro. Esse pensamento não me saia da cabeça.
Nessa época, o trabalho já estava rascunhado e foi só acrescentar esse dado antes de submetê-lo para as revistas. A primeira submissão foi um balde de água gelada: o trabalho fora recusado. Os revisores não viram a relevância em usar neurônios humanos. Com medo de soar arrogante, não havia deixado claras as implicações do trabalho. Mea culpa. Reescrevi tudo e mandamos para a Cell, com receio de que essa revista fosse ainda mais rigorosa que a anterior. Dessa vez, todos os revisores foram positivos. Porém, o número de experimentos extras, controles etc. que haviam pedido era surreal. Recrutamos outros pesquisadores para ajudar em técnicas mais específicas.
Hoje em dia, a ciência é multidisciplinar. É um erro tentar fazer tudo sozinho. Foram mais alguns meses de completa insanidade. Ganhei meus primeiros cabelos brancos, Carol ganhou uma gastrite e o Cassiano aumentou o consumo de chocolate. O trabalho ainda passou por mais algumas revisões até ser formalmente aceito pela revista. A comparação entre as atividades de neurônios autistas e neurônios normais foi ilustrada em vídeo, que vale mais do que mil palavras.
O impacto
O espectro autista afeta 1 em cada 105 crianças nos EUA. O autismo, assim como outras doenças psiquiátricas, sofre com o estigma de que não tem cura. Além disso, existe um outro estigma: o de que essas doenças são causadas por falta de afeto ou por descuido dos pais. Na década de 70, mães e pais de pacientes com doenças psiquiátricas eram submetidos a tratamentos médicos, não as crianças. Em conversa com pais, muitos ainda revelam o peso desse preconceito, vindo de outros pais ou da culpa que sentem.
Em nossos experimentos, conseguimos corrigir o defeito genético nos neurônios dos pacientes, evitando o aparecimento das “características autistas”. Esse dado sugere uma forte evidência contra fatores ambientais no desenvolvimento dessa síndrome. Como não conhecemos a base genética de outros pacientes com autismo, fica difícil estender essas observações para todo o espectro. De qualquer forma, entender como o autismo surge, suas bases biológicas e neuronais, deve contribuir para a redução desse estigma e estereótipo de pacientes com doenças mentais.
O fato de conseguir modelar o espectro autista em laboratório deve abrir portas para uma série de outras doenças neurológicas. Antecipo que outros grupos vão utilizar a mesma estratégia para esquizofrenia, depressão, bipolaridade, entre tantas outras doenças do desenvolvimento ou psiquiátricas. O impacto do uso das células iPS nesse tipo de modelagem promete acelerar as descobertas cientificas no mundo todo. Além disso, sugere que a técnica possa ser implementada como uma ferramenta de diagnóstico, permitindo antecipar o aparecimento dos sintomas e começar os tratamentos mais cedo. Imagino que as firmas de seguro-saúde vão compreender o significado disso em breve. De qualquer forma, acho que esse é o primeiro passo para uma futura medicina personalizada.
Mas talvez o impacto maior seja o da possibilidade de reverter a doença. As drogas que foram usadas no trabalho para a reversão dos neurônios dos pacientes para um estado “normal” foram o IGF1 e a gentamicina. O IGF1 é um fator que estimula as células neurais, provavelmente através de uma cascata de ativação de outros genes que auxiliam no desenvolvimento neuronal. Para chegar na fase clínica, o IGF1 teria de ser modificado quimicamente para facilitar sua penetração no sistema nervoso. Nossos dados mostram que será preciso cautela, pois o IGF1 pode super-estimular os neurônios, causando efeitos colaterais como ataques epilépticos, por exemplo. A gentamicina atua de uma outra forma, apenas em mutações genéticas específicas. Além disso, é tóxica in vivo.
De qualquer forma, tenho recebido algumas mensagens da industria farmacêutica, o que indica um interesse desse setor no desenvolvimento de melhores drogas. Melhor ainda, nosso dados estão sendo úteis para o avanço dos primeiros testes clínicos de pacientes Rett, em Boston, EUA. Resultados positivos desse teste vão expandir as possibilidades de tratamento para outras partes do mundo.
Consequências da reversão
Vamos supor que realmente encontremos uma droga capaz de reverter o estado autista de neurônios em cultura e que, quando aplicados em humanos, conseguisse consertar todos os neurônios do cérebro humano. Seria essa então a cura do autismo? As observações que fizemos dizem respeito ao número de sinapses. Sinapses são as estruturas responsáveis pela transmissão da informação entre um neurônio e outro. Essas conexões nervosas formam redes que estão envolvidas em diversos processos cognitivos, como aprendizado, consciência e memória. Ao elevarmos o número de sinapses no cérebro de um paciente com autismo por meio de um futuro tratamento, a expectativa é que ele restabeleça conexões neurais, comportando-se como um cérebro normal.
Mas o que aconteceria com a memória? E as habilidades cognitivas que diferenciam das outras crianças e as tornam tão especiais? Tive essa discussão com Ana Parreira, mãe de uma criança com Asperger, outra síndrome do espectro autista. Ana me escreveu por e-mail, preocupada com o fato de que uma futura terapia poderia apagar as habilidades criativas de seu filho. Na verdade, essa é uma possibilidade real, mas não sabemos se isso vai realmente acontecer. Só vamos descobrir durante os ensaios clínicos, pois modelos animais são difíceis de interpretar, principalmente quando olhamos para criatividade, afeto e outras características tipicamente humanas.
Assim como Ana, recebi centenas de mensagens de familiares e pais de pacientes com o espectro autista. Infelizmente, não vou conseguir responder a todos, mas não deixo de apreciar todo o carinho e apoio. Isso traz muita motivação para mim e todo o grupo. Sou grato e honrado por ter tocado tantas pessoas através da ciência.
O futuro
Nosso grupo decidiu que não vai esperar pelo posicionamento da indústria farmacêutica, em geral com menos entusiasmo para projetos arriscados. Vamos seguir em frente de forma independente para o estabelecimento de uma plataforma para triagem de novos medicamentos automatizada. Esse projeto multidisciplinar envolve profissionais de diversas áreas do conhecimento, biólogos, engenheiros, matemáticos e médicos. Não vai ser fácil, pois precisamos otimizar diversas etapas do processo, mas qual seria a graça da vida se tudo fosse simples e previsível?
Tenho orgulho de ter participado com meus colegas dessa pesquisa que rompe barreiras e desafia os fundamentos da neurociência e da própria psiquiatria. Nasci ouvindo que o espectro autista não tem cura. Acho que isso é um mito. Amanhã no laboratório vamos ousar algo novo. A ciência é assim, todo dia uma nova aventura, trazendo esperanças e nos fazendo sonhar com oportunidades que antes pareciam impossíveis.
A chave que está abrindo as portas para crianças autistas, ginástica olímpica.
Régis Rösing, repórter do "Esporte Espetacular", revela como crianças com autismo passam a interagir com o mundo exterior após se envolverem com ginástica olímpica
O autismo é classificado como um transtorno definido por alterações antes dos três anos de idade e que se caracteriza por alterações na comunicação, interação social e uso da imaginação.
Crianças com autismo vivem em um mundo só delas, não interagem com o que há em volta. Para elas, o mundo interior é muito maior do que o exterior. Mas o trabalho de um ex-atleta de ginástica olímpica, o professor Rodrigo Brivia, está surpreendendo médicos especialistas no assunto e, principalmente, os pais dessas crianças.
Rodrigo usa todos os aparelhos da ginástica olímpica como parte do tratamento. Simula competição, vibração, faz os movimentos como se estivesse se apresentando com a criança do lado e, de repente, o que ele faz começa a ser imitado. As crianças pulam de alegria, brincam, e algumas começam a dizer as primeiras palavras.
O esporte como instrumento e ferramenta de interação tem sido a chave que está abrindo as portas para crianças autistas. Tudo que elas precisam é a combinação de atenção e amor. O repórter Régis Rösing foi conhecer de perto essa iniciativa, que acontece em uma academia de ginástica, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Rodrigo usa todos os aparelhos da ginástica olímpica como parte do tratamento. Simula competição, vibração, faz os movimentos como se estivesse se apresentando com a criança do lado e, de repente, o que ele faz começa a ser imitado. As crianças pulam de alegria, brincam, e algumas começam a dizer as primeiras palavras.
O esporte como instrumento e ferramenta de interação tem sido a chave que está abrindo as portas para crianças autistas. Tudo que elas precisam é a combinação de atenção e amor. O repórter Régis Rösing foi conhecer de perto essa iniciativa, que acontece em uma academia de ginástica, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
"Esporte Espetacular" 12 de dezembro de 2010.
Fonte: Globo Esporte
Quebra-cabeça de 28 mil peças foi montado em prol dos autistas em 2008
WASHINGTON - O maior quebra-cabeça do mundo, com 6 mil m², foi montado nos Estados Unidos com o objetivo de coletar fundos para a pesquisa sobre o autismo.
Na Virgínia, crianças autistas e seus pais montaram as 28 mil peças do quebra-cabeça, cada uma com uma mensagem de reflexão sobre o autismo.
Segundo os organizadores da iniciativa, o quebra-cabeça foi reconhecido por representantes do Guinness como um recorde mundial.
Cada peça do quebra-cabeça será vendida por US$ 5 e o dinheiro arrecadado será destinado à fundação de um centro de pesquisas sobre o autismo e a um centro de lazer para portadores da doença.
April 29, 2008
Poema do dia mundial do Autismo
Poema do dia
mundial do Autismo
Ama-me,
Por favor
Como eu sou…
Ama-me
Como tu
Gostarias que eu fosse.
Quem me concebeu…
Não imaginou
Que seria assim tão duro…
Entender que vim autista.
Mas ama-me
Fala-me desse amor
Mesmo que eu não pareça entender
Mesmo que eu fuja e me refugie
Busca-me não me deixes perder…
Ama-me…
Como se visses em mim
A imagem e semelhança de ti
No espelho das águas…
Não te importes
Com minha falta de compreensão
Treina-me para entender o mundo
Mas acima de tudo
Ama-me…
Como se eu tudo entendesse
Como se eu não fosse um peso
Demonstra teu amor
Mesmo que eu não saiba
O significado da palavra…
Deus, eu posso sentir…
E cre que em meus sonhos
Eu vejo-te e amo-te…
Não me negues esse amor
Que enxerga além da matéria
Pois é dele que necessito…
E se nas horas que de ti eu exijo demais
Mesmo nas dúvidas constantes
Aquelas que tu às vezes tens vontade de desistir
Por favor, não desistas, mas Ama-me….
Autora: Liê RibeiroPaz Luz mãe do Gabriel Gustavo que é um menino autista.
Adaptado por Ricardo Dória
terça-feira, 8 de março de 2011
Feliz Dia Internacional da Mulher!!!
Os homens distinguem-se pelo que fazem, as mulheres pelo que levam os homens a fazer.
Carlos Drummond de Andrade
Carlos Drummond de Andrade
"AS MULHERES SÃO FANTÁSTICAS" !!!
A Mãe e o Pai estavam assistindo televisão, quando a Mãe disse: - Estou cansada e já é tarde, vou me deitar!
Foi à cozinha fazer os sanduíches para o lanche do dia seguinte na escola, passou água nas taças das pipocas, tirou a carne do freezer para o jantar do dia seguinte, confirmou se as caixas dos cereais estavam vazias, encheu o açucareiro, pôs tijelas e talheres na mesa e preparou a cafeteira do café para estar pronta para ligar no dia seguinte.
Pôs ainda umas roupas na máquina de lavar, passou uma camisa a ferro pregou um botão que estava caindo. Guardou umas peças de jogo que ficaram em cima da mesa, e pôs o telefone no lugar.
Regou as plantas, despejou o lixo, e pendurou uma toalha para secar. Bocejou, espreguiçou-se, e foi para o quarto.
Parou ainda no escritório e escreveu uma nota para o Professor do filho, pôs num envelope junto com o dinheiro para pagamento de uma visita de estudo, e apanhou um caderno que estava caído debaixo da cadeira.
Assinou um cartão de aniversário para uma amiga, selou o envelope, e fez uma pequena lista para o supermercado. Colocou ambos perto da carteira. Nessa altura, o Pai disse lá da sala: “Pensei que você tinha ido se deitar”.
“Estou a caminho” respondeu ela. Pôs água na tijela do cão e chamou o gato para dentro de casa. Certificou-se de que as portas estavam fechadas. Espreitou para o quarto de cada um dos filhos, apagou a luz do corredor, pendurou uma camisa, atirou umas meias para o cesto de roupa suja e conversou um bocadinho com o mais velho que ainda estava estudando no quarto.
Já no quarto, acertou o despertador, preparou a roupa para o dia seguinte e arrumou os sapatos. Depois lavou o rosto, passou creme, escovou os dentes e acertou uma unha quebrada.
A essa altura, o pai desligou a televisão e disse: “Vou me deitar”. E foi. Sem mais nada. Notaram aqui alguma coisa de extraordinário? Ainda perguntaram por que é que as mulheres vivem mais... E são tão MARAVILHOSAS?
PORQUE SÃO MAIS FORTES... FEITAS PARA RESISTIR... Envie isto às mulheres fantásticas que conhece. Elas vão amar!
E para os homens também: pode ser que eles percebam alguma coisa...
“Existem muitos motivos para não se amar uma pessoa, mas apenas um para amá-la”.
Carlos Drummond de Andrade
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